Histórias da Geologia

Este blog pretende ser um espaço de reflexão sobre a evolução do conhecimento geológico ao longo dos tempos, principalmente a partir do século XVII, não esquecendo porém as pequenas histórias que fazem a grande história

sábado, abril 01, 2006

As cóleras do Vesúvio



Anteriormente à destruição de Pompeia e Herculanum pelo Vesúvio, em 79 a.C. , uma grande erupção já havia devastado o local onde hoje se encontra a cidade de Nápoles. Calcula-se que isso possa ter acontecido há cerca de 3 800 anos, em plena Idade do Bronze. Foram descobertas, por uma equipa de investigação italo-amaricana, milhares de pegadas humanas com a mesma direcção que fazem acreditar terem existido sinais de perigo suficientes para fazerem com que as populações fugissem do local. Mas, nas cinzas, que se espalharam até 25 km de distância da cratera, foram também encontrados esqueletos humanos e de animais.

http://sciences.nouvelobs.com/sci_20060306.OBS9585.html?0049


Esta notícia, que recolhi da revista Sciences et Avenir (Abril 2006), fez-me recordar AS CARTAS DE PLÍNIO O JOVEM AO HISTORIADOR TÁCITO

Plínio o Jovem (62-114 d.C.) descreve, em duas cartas escritas ao historiador Tácito (104 d.C.) a morte do seu tio, Plínio o Velho (23-79 d.C.), em consequência da erupção do Vesúvio. Estas cartas têm sido consideradas como um dos primeiros documentos importantes para a vulcanologia. Plínio o Velho é autor de uma obra importante, Naturalis Historia, muito citada pelos naturalistas até à Idade Moderna. Quando ocorreu a erupção do Vesúvio Plínio o Velho era almirante da esquadra do Mediterrâneo, encontrando-se por isso em Missena. Plínio o Jovem descreve assim o sucedido ao seu tio [extracto da primeira carta]:

"Pede-me informações sobre a morte de meu tio, para mais fielmente transmitir a sua narrativa à posteridade. Agradeço-lhe porque creio firmemente que, se escrever a história dos seus últimos momentos, elles se cobriarão de gloria immorredoura. E, posto que elle morresse n'um desastre que assolou a mais rica região do universo, succumbindo em meio da destruição de povos e cidades inteirras, victima d'uma catastrophe que lle eternisará a memoria; e ainda que por suas proprias mãos elle mesmo levantasse tantos monumentos duradouros do seu genio, a immortalidade das vossas obras muito augmentará a do seu proprio nome. Felizes dos homens a quem coube por sorte fazer cousas dignas de serem escriptas, ou escrevel-as dignas de serem lidas! masi felizes ainda aquelles a quem os deuses concederam esta dupla vantagem! Meu tio será d'estes ultimos já pelos seus, já por vossos escriptos. Venho pois voluntariamente tentar o trabalho que me impõe ou, para melhor dizer, reclamal-o.

Por essa ocasião achava-se elle em Misena, commandando a armada. No vigesimo terceiro dia d'Agosto, pouco mais ou menos á uma hora da tarde, minha mãe preveniu-o do apparecimento d'uma nuvem de grandeza e forma extraordinárias. Depois de haver feito a sua estação ao Sol e tomado banho frio, tinha ido deitar-se no leito em que descançava ordinariamente e entregára-se ao estudo. Levantou-se immediatamente e dirigiu-se a um logar elevado d'onde podia observar bem este prodigio. A nuvem subia aos ares, sem ser possivel determinar, de tão grande distância, qual a montanha d'onde partira; o proprio phenomeno fez conhecer mais tarde que fora do Vesúvio. Assemelhava-se na forma a uma árvore e, mais particularmente, a um pinheiro; por isso que, elevando-se para o céu como um tronco immenso, apresentava-se no topo dividida em ramos horisontaes. Imagino eu que estes vapores, sendo impellidos por uma corrente subterranea muito impetuosa, e chegando a uma certa altura em que a acção d'essa corrente se não fazia sentir, ganharam em superficie, alastrando, em virtude do seu proprio peso. Appareciam ora completamente brancos, ora pretos, ora diversamente corados, conforme estavam mais carregados de cinza ou de terra.

Este prodigio causou grande surpresa em meu tio e, no seu zêlo pela sciencia, quiz examinal-o de mais perto. Mandou preparar uma pequena embarcação, deixando-me a liberdade de o acompanhar. Respondi-lhe que preferia ficar estudando; elle mesmo me tinha dado, por acaso, o quer que era para eu escrever. Acabava de sahir de casa, quando lle foi entregue um bilhete de Rectina, mulher de Coesio Bassio, que aterrada pela imminencia do perigo (por isso que, ficando a sua casa situada na falda do Vesúvio, só por mar poderia salvar-se) lhe pedia para a socorrer. Mudou então d'intento, realisando por dedicação o que ao principio emprehendera pelo simples desejo de se instruir. Deu ordem para se prepararem alguns quadriremos e embarcou elle mesmo para ir em socorro de Rectina e de muitos outros habitantes de deliciosos sitios. Dirigiu-se à pressa para os logares d'onde todos fugiam; caminhou direito ao perigo, affrontando-o com a maior serenidade, a ponto de fazer a descripção dos diversos incidentes e dos variados aspectos que o prodigio lle oferecia à vista.

Cahia já sobre os navios uma cinza tanto mais quente quanto mais se aproximavam, d'envolta com pedras calcinadas e fragmentos negros, lascados pela violencia do fogo. O mar baixará de repente, tornando innacessivel a praia, em virtude dos montões de pedra que a cobriam. Meu tio ficou por um momento indeciso sobre se voltaria para traz; mas immediatamente, como o piloto o acconselhasse a que voltasse, respondeu-lhe: «a fortuna favorece os audazes; leva-me a casa de Pompiano». Pompiano estava em Stabies, do outro lado d'um pequeno golfo, formado pela curva insensivel da margem. Em vista do perigo que se aproximava em passos largos, se bem que ainda affastado, Pompiano havia feito conduzir para ahi e embarcar todos os seus moveis e só esperava por um vento menos contrario para partir. Meu tio, favorecido pelo mesmo vento, salta em terra, dirige-se a casa d'elle, abraça-o, acalma a sua agitação, conforta-o, anima-o e, para de todo dissipar o terror de que elle se achava possuido, fez-se conduzir ao banho. Depois sentou-se à mesa e comeu com alegria, ou, com toda a apparencia d'alegria, o que não suppõe menos força d'alma.

Viam-se contudo luzir em muitos pontos do monte Vesuvio grandes linguas de fogoe um vasto esbraseamento, tanto mais brilhante quanto mais profundas eram as trevas que o envolviam. Para tranquilisar os seus companheiros, meu tio dizia-lhes que era o incendio das casas abandonadas pelos camponezes. Em seguida foi deitar-se e dormiu um profundo somno, e tão profundo que da porta ouvia-se-lhe o ruido da respiração. como porem o pateo que dava para o seu aposento começasse a encher-se de cinzas e pedras, a ponto de em pouco lhe poder ser cortada a saida, despertaram-no; levantou-se e foi junctar-se a Pompiano e às outras pessoas que haviam ficado alerta. Discutiram então se deviam conservar-se dentro de casa ou vaguear pelos campos; porquanto as casas estavam de tal modo abaladas pelos succesivos e violentos tremores de terra, que pareciam levantas das fundações, impellidas em todos os sentidos alternadamente e restituidas emfim á posição primitiva. Por outro lado havia a temer, fóra da cidade, a chuva de pedras, posto fossem de pequenas dimensões e carcomidas pelo fogo. D'estes perigos adoptaram o menor. No espirito do meu tio dominou a razão mais forte sobre a mais fraca; no espirito dos que o cercavam prevaleceu um temor sobre o outro. Ataram em volta da cabeça travesseiros, éguisa d'escudos contras as pedras que cahiam.

De resto despontava o dia, se bem que os envolvesse a mais escura noite, alumiada comtudo por labaredas de toda a especie. Quizeram aproximar-se da praia para ver se o mar permittiria qualquer tentativa, mas acharam-no sempre procelloso e contrario. Chegado ahi, meu tio deitou-se sobre um lençol estendido no solo, pediu agua fria e bebeu dois goles. Pouco depois as chamas e um cheiro d'enxofre que as precedia e annunciava, poseram tudo em debandada e obrgaram meu tio a affastar-se. Levantou-se encostado a dois escravos e no mesmo instante cahiu morto. Penso que esse espesso fumo lhe suspendeu a respiração e o suffocou. (...)

Adaptado de Zurcher e Margollé, (s.d.), Volcões e Terramotos. Porto: Magalhães e Moniz.

3 Comments:

Anonymous Anónimo said...

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7:08 da manhã  
Blogger yanmaneee said...

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12:10 da tarde  
Blogger Unknown said...

Boa noite tudo bem?

Meu nome é Nélio França sou Arquivista, gostaria de uma informação,
as cartas inscritas por Plínio "o jovem" se encontram em qual Arquivo
na Itália?

meu email é francanelio7@gmail.com




2:52 da manhã  

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